Crítica Toma Lá Dá Cá

25-09-2011 13:09
Na rentrée lisboeta, Lourenço Viegas voltou
à acção numa casa simples da Bica.
E matou saudades de umas boas batatas fritas caseiras.

Já andava há uns anos com falta de qualquer coisa, mas
não sabia bem do que era.Uns diziam que era mulheres,
outros magnésio,outros mudar para a Meo para ter o Canal Q.
Mas não,o que me faltava mesmo eram boas batatas fritas.
E acho que não tenho comido melhores do que no Toma Lá Dá Cá.
Mas antes das batatas o resto.
O Toma Lá Dá Cá é ali na Bica,quem desce o elevador na primeira á direita.
E nao bastava apenas o Bairro Alto lá no alto,nem o Adamastor lá ao fundo,
que agora a Bica tem ela própria vida.
Ou seja em semântica Remax boas acessibilidades e envolvente em zona jovem
mas com cachet.
No meio de tudo isto, o Toma Lá Dá Cá é um restaurante sóbrio com um nome irritante,
O nome é nome de um programa de serviçozinho público de televisão,mas a realidade
é de gente empreendedora imparável,numa casa sempre cheia(reservas só para grupos grandes,mais de dez pessoas).
Uma pratada de jaquinzinhos bem fritos,frescos com a carne húmida e firme dentro
da armadura de fritura.Comida para comer à mão,com espinhas e tudo.
Na mesma ao lado,as estrangeiras olhavam espantadas,que lá no pais delas nao se
deve comer com as mãos(muitas mesas com estrangeiros são a certeza de um alta cotação
em guias da especialidade,ou de um ranking elevado em sites de gastrodemocracia).
Bem se pode escolher os amigos com um prato de jaquinzinhos pela frente:deitas
fora os que usam garfo e faca,guardas os que comem à mão da cauda à cabeça.
Para o purgatório vão os que deitam no prato a espinha central,mais agressiva de mucosas mais sensíveis.
No Toma Lá Dá Cá o arroz de tomaste que acompanhava os bichos vinha molhado,mas o arroz
bem cheio e com dureza distinta.
Continuando em comidas primárias, vale a pena o onglet com chalotas.
Onglet é um corte da vaca junto ao diafragma,com um sabor acentuado,
delicioso,carne a puxar a entranha com personalidade e atitude.
Vem com uma densa cebolada de chalotas que enriquece ainda mais.
A alheira de caça é boa, bem frita,com bom grelo avinagrado.
Uma alheira de aguenta bem a estupidez de a pedirem fora de época.
Em cima de tudo isto,batatas fritas divinais.Bem cortados os palitos,
nem grandes,nem pequenos,mas sobretudo todos diferentes.
Um dos segredos da boa batata frita, ao contrário do que se lê
na melhor literatura,é o palito não ser simétrico.
Se estreitar num dos lados,em cunha,a mesma batata tem cambientes de sabor
e textura,e ganha em realidade a complexidade.
O serviço é simpático e caseiro,com todo o espectro de atributos
que isso traz,desde o senhor cujo sangue correm anos de serviço e simpátia,
ao jovem sorridente que não faz ideia dos pratos que serve.
No fim,um toque requintado no cheesecale, em que o doce é
vertido de um frasco em quantidades muito contidas que não
assassinam a boa qualidade do bolo.
Vinte, vinte e poucos euros por pessoa,pedido mais do que o honesto para a comida também
honesta que nos dão.
Sobretudo quando colmatam uma falha de tantos anos,de boas batatas fritas.

*82 Time Out Lisboa 19 - 25 Setembro 2012